Então

domingo, 27 de fevereiro de 2011

A coxinha reencontrada - HUMBERTO WERNECK



HUMBERTO WERNECK

Longe de mim querer matar você de inveja, mas dias atrás cravei os dentes numa coxinha de camarão com catupiry. Numa, não; em três. E saiba que o "inha", aí, não é diminutivo, é tratamento carinhoso, um tanto emocionado, da parte de quem por 13 anos esteve privado dessa rechonchuda maravilha.


Bobagem minha: para morrer de inveja, você precisaria saber o que vem a ser uma coxinha de camarão com catupiry. OK, estou informado de que há por aí algo que se apresenta como tal, mas posso asseverar que se trata de embustes culinários. Não, não falo desses simulacros - falo da legítima coxinha de camarão com catupiry, da única, muito imitada e jamais igualada, que existiu em Belo Horizonte durante pouco mais de 20 anos, até desaparecer, sem deixar sucessoras à altura, no ano por isso infausto de 1998.
Nunca me conformei com o sumiço do pitéu com que me regalei décadas a fio, toda vez que minhas papilas gustativas visitavam a capital mineira. Alguns meses atrás, numa crônica para o guia de comes & bebes da Veja que circula em Belo Horizonte, já no título fui soltando, não a franga, mas o camarão: "Saudade da coxa de catupiry." Na última linha, joguei sem maior esperança uma garrafa ao mar: "Tem por aí alguma dona que faz?"
Pois não é que apareceu uma? E não qualquer dona: ninguém menos que Thereza Oliveira, a inventora da supracitada perdição gastronômica. De Tiradentes, onde vive faz uns anos, ela ergueu um dedo, olha eu aqui!, e deixou no ar a tentação: que eu fosse aplacar a saudade da coxinha de camarão com catupiry.
Quis a sorte que recentemente me viesse convite para lançar um livro ali, e quando escrevi a Thereza para dizer que estava a caminho, ela anunciou a coincidência: eu ia me hospedar ao lado de seu charmoso mocó tiradentino - num alto de morro onde de uns anos para cá se construíram várias casas "antigas". Lá fui bater, salivando, mal pus a mala na pousada, e na porta o Levindo, marido da Thereza, já foi me pondo a par da peleja que fora conseguir camarões - aqueles bitelos, que em Minas chamam de "VG", iniciais de "verdadeiramente grande". (Há também o "VGzinho").
Além de três formidandas coxas de catupiry, Verdadeiramente Gloriosas, Thereza me serviu a história do fabuloso salgado, por ela concebido na cozinha de sua inesquecível Doce Docê, casa que na capital mineira foi o máximo em doces e salgados entre 1973 e 1998. Seu irmão Pedro, hoje embaixador, morava no Rio e nas confeitarias achava constrangedor ter que pedir um monte de salgadinhos para matar a fome - será que não dava para fazer um salgadão? Thereza, primeiro, foi de peito de frango, que teve a ideia inédita de revestir de catupiry - até que lhe viesse a ideia melhor ainda de trocar o frango pelo camarão. 
Pra quê! - lembra ela. A novidade se impôs a todas as demais delícias da Doce Docê. "As coxinhas desbancaram tudo", conta Thereza. Filas na porta. A loja se tornou a maior compradora de catupiry. Não espanta que tenham pipocado contrafações. Mas como copiar, se o fabricante, instado pela quituteira, desenvolveu para ela um catupiry exclusivo, cremoso mas apto a derreter? Para não falar nos segredos da massa, um angu cozido e sovado, mas muito sovado mesmo - "tem que ter braço, tem que ser forte" - numa pedra mármore, "até virar um veludo".
Mas por que então a loja, que teve três pontos em Belo Horizonte e um em Ouro Preto, acabou fechando? Primeiro foram "os fiscais do Sarney", num tempo em que a burrice oficial tabelou até salgadinho, pondo no mesmo balaio coxinhas nobres e plebeias. "Um dia, por causa de uns centavos, teve viatura na porta, queriam me levar presa", escandaliza-se Thereza. Depois, foi uma temporada longe da cidade, acompanhando o marido em Brasília. Mais adiante, o escasso apetite dos três rapazes do casal pelo negócio. Por fim, como tudo o mais, o requeijão entrou em decadência - "o catupiry não é mais o mesmo, não derrete", lamenta Thereza, cansada de garimpar sucedâneos. Ressuscitar a casa em Tiradentes, onde tem ateliê de artesanato? Ela não se anima. Assim sendo, coxinha de camarão com catupiry, só de vez em quando e para uns happy few - mas fiquemos por aqui, eu já disse que não quero matar você de inveja...



fonte Estado de São Paulo

Julio Cortazar - El Perseguidor



Biblioteca básica de Moacyr Scliar



Moacyr Scliar em sua biblioteca - FOTO: Adriana Franciosi/ZH 

1. A Guerra no Bom Fim (L&PM, 1972) 
Em seu primeiro romance, Scliar narra a história de Joel, que se recorda de sua infância nos anos 1940 no bairro judaico do Bom Fim, em Porto Alegre, e sua descoberta da maturidade em meio aos ecos da guerra na Europa.
2. O Exército de um Homem Só (L&PM, 1973)
Comunista durante a juventude, Scliar faz do protagonista do romance, Mayer Guinzburg, o “Capitão Birobdjan”, sua versão desencantada do Quixote.
3. O Centauro no Jardim (Companhia das Letras, 1980)
No interior gaúcho, o quarto filho de uma família nasce centauro. Metáfora a um só tempo da condição judaica, do imigrante e da individualidade atropelada pelo coletivo. É uma de suas obras-primas.
4.Contos Reunidos (Companhia das Letras, 1995)
Inclui seus melhores contos, como A Balada do Falso Messias, As Ursas, Os Leões, Pausa, Lavínia e Cego e Amigo Gedeão à Beira da Estrada.
5. A Mulher que Escreveu a Bíblia (Cia. das Letras, 1999)
Primeiro livro da “trilogia bíblica”, tem como protagonista a concubina mais feia do harém do Rei Salomão.
6. Saturno nos Trópicos (Companhia das Letras, 2003)
Ampla e rigorosa história da melancolia.
7. Os Vendilhões do Templo (Companhia das Letras, 2006)
O autor reconta o episódio em que Jesus expulsa os vendilhões do templo pela ótica de um deles, uma espécie de protocapitalista com projetos grandiosos.
8. Enigmas da Culpa (Objetiva, 2007)
Ensaio no qual o escritor analisa a presença central da culpa no centro da civilização judaico-cristã.
9. Manual da Paixão Solitária (Companhia das Letras, 2008)
Com humor, Scliar reconta a história da família de Onã – aquele mesmo, que deu origem à palavra “onanismo” para não engravidar a mulher de seu irmão. Prêmio Jabuti de Livro do Ano.
10. Eu Vos Abraço, Milhões (Companhia das Letras, 2010)
Inflamado pelo sonho socialista, jovem filho de capataz muda-se para o Rio em 1929, testemunha os efeitos do Crash da bolsa de Nova York, a construção do Cristo Redentor e a revolução liderada por Getúlio Vargas.

MOACYR SCLIAR - A síndrome do ninho vazio – ou a glória dos múltiplos ninhos?


Convenhamos, a independência dos filhos é, ao fim e ao cabo, um triunfo para os pais 

Ano-Novo, vida nova, é um dito clássico. Que, contudo, raramente se traduz em mudança real. Na maioria das vezes, continuamos levando nossas vidas, mantendo nossas rotinas, postergando nossos projetos revolucionários. Mas toda regra tem exceção, e o Beto Scliar é disso um exemplo: ele começou 2011 no seu próprio apartamento, por ele muito bem instalado e decorado. Mais do que isso, e ao menos para seus orgulhosos pais e para a Ana, está se revelando um grande dono de casa. Ou seja, é um marco em sua bela trajetória pessoal e profissional. 

Em algum momento os filhos têm de sair do reduto paterno-materno. A época para isso varia de acordo com as culturas, com as famílias. Nos Estados Unidos, a independência tradicionalmente ocorre no momento em que o jovem vai para o college, que mais ou menos equivale à nossa universidade. A regra é que isso se faça com mudança de cidade (quanto mais distante melhor), e a partir daí o rapaz ou a moça terão de tomar conta de si mesmos. 

Na classe média brasileira, a coisa sempre foi mais flexível, e essa flexibilidade aumentou na medida em que cresceu a expectativa de vida e na medida em que a independência, cada vez mais dependente do diploma, do mestrado, do doutorado, foi sendo adiada. Uma adolescência prolongada, portanto, mas não infinita (ou, parafraseando Vinicius, infinita enquanto dura). De qualquer modo, a ideia da família extensa, que até era um costume no período colonial (entre os ricos ao menos) foi ficando coisa do passado. 

Claro, é uma mudança, e toda a mudança tem suas implicações. Amigos nos perguntaram, e com razão, se já estamos com a síndrome do ninho vazio. A expressão, provavelmente de origem americana (“empty nest syndrome”) é muito conhecida; remete a quase 200 mil referências no Google, a dezenas de artigos que analisam esta situação. Os autores apontam algumas vantagens (o refrigerador não é mais saqueado pelo filho e pelos amigos, a mãe não tem mais que arrumar quartos que parecem um cenário de guerra, a casa fica mais silenciosa), mas reconhecem que esta ordem, esta limpeza, este silêncio podem ter o seu lado melancólico. E aí sucedem-se os conselhos tipo autoajuda, que incluem até indicações de terapia. 

Será que é para tanto? Convenhamos, a independência dos filhos é, ao fim e ao cabo, um triunfo para os pais. O ninho poderá ficar um tanto vazio, mas a verdade é que outro ninho surge, não raro vários deles. São casas que acolhem os pais, são lugares que lhe proporcionam surpresas. É a nossa superfície de contato com o mundo que se expande, e isso sempre é consolador. 

Não é de admirar, pois, que repetidos estudos realizados a respeito (nos Estados Unidos, obviamente; onde mais?) mostrem que o índice de felicidade conjugal, avaliado através de indicadores, melhora quando os ninhos ficam múltiplos, e quando o casal pode, de certa forma, se redescobrir. 

Voar É com os Pássaros era o título de um antigo e clássico filme. Não, voar não é só com os pássaros. Nós também voamos, seja nos aviões (quando os voos não são cancelados), seja através de nossa imaginação. Cada ninho, onde quer que esteja, é uma base para os sonhos. Entre eles, claro, o sonho de nossa própria casa. 

A propósito das palavras-chaves da atualidade recebi colaboração de leitores, propondo, entre outros, os termos “bombar” (“A economia está bombando”) e “repaginar”, que é usado numa infinidade de situações, desde roupas, até a vida em geral. A respeito dos problemas de estradas no RS, o dr. Jaime José Farina, médico e empresário de turismo, propõe duas medidas: a revitalização da BR-116 e o prolongamento da Rodovia do Parque (obra do PAC) até Portão (17 Km), que facilitará o trânsito para a Serra. 

Agradeço às mensagens de Mauro Duarte, Maurício Ferreira de Macedo, Antenor E. Fernández, Leandro A. Pereira, Nora Peixoto, Guiherme Giacomolli, Gilda Haubert e Giuliana Ferri.
 fonte: 09/01/2001,  Zero Hora

Morre Moacyr Scliar



Literatura brasileira perde um mestre

Ser um escritor não é necessariamente gostar de escrever — alguns nem gostam, dado o quanto sofrem na construção de um texto.
Com Moacyr Scliar, morto à 1h deste domingo por falência múltipla de órgãos devido às consequências de um acidente vascular cerebral (AVC), acontecia o contrário. Poucos escritores terão gostado tanto de escrever — e terão demonstrado tanta facilidade em fazer isso.
Aos 73 anos, o porto-alegrense Moacyr Jaime Scliar havia construído uma obra sólida, com mais de um livro publicado para cada ano de vida, em uma ampla gama de gêneros: contos, romances, literatura infanto-juvenil, ensaios. Além disso, era colunista frequente de uma dezena de publicações, de jornais diários como Zero Hora e Folha de S. Paulo a revistas técnicas. Escrevia em qualquer lugar a qualquer hora, auxiliado pela tecnologia – jamais viajava sem seu laptop. Tal dedicação à palavra e ao ofício que exercia com evidente prazer transformaram Scliar em um dos autores mais respeitados do Brasil.
Scliar morreu no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, onde estava internado desde 11 de janeiro. O escritor havia sido admitido no hospital para a retirada de pólipos (formações benignas) no intestino. A cirurgia, simples, havia transcorrido sem complicações. Scliar já se recuperava quando sofreu um AVC – obstrução de uma artéria que irriga o cérebro – de extrema gravidade.
Scliar nasceu em 1937, no bairro judaico do Bom Fim, em Porto Alegre, filho de José e Sara Scliar – a mãe, professora primária, seria a grande responsável pela paixão do escritor pelas letras: foi ela quem o alfabetizou. Formado médico sanitarista pela UFRGS, ingressou na profissão em 1962. Casado com Judith, professora, e pai do fotógrafo Roberto, Scliar havia também passado pela experiência de professor visitante em universidades estrangeiras e tinha obras traduzidas em uma dezena de idiomas, entre elas o russo e o hebraico. O trabalho como médico de saúde pública seria crucial na vida e na obra de Scliar – seu primeiro livro, publicado em 1962, foi uma coletânea de contos inspirados pela prática médica, Histórias de Médico em Formação, volume que mais tarde Scliar excluiria de sua bibliografia oficial por considerá-lo a obra prematura de um autor que ainda não estava pronto.
Nos seus livros seguintes, Scliar jamais se permitiria outra publicação prematura. Do mesmo modo como escrevia com velocidade e prazer, Scliar também revisava obsessivamente o próprio texto, a ponto de às vezes reescrever uma obra do zero por ter encontrado um ponto de vista narrativo mais adequado.
— Se o escritor não tiver prazer escrevendo, o leitor também não terá — comentou em uma entrevista concedida quando completou 70 anos, em 2007.
fonte:ZH Escrito por Redação em 27/02/11 às 1:51

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Beba Coca Cola


Animação sobre música de Gilberto Mendes e poesia de Décio Pignatari.
Com o Coral Gilberto Mendes, sob regência de Paulo Rowlands

Quando Picasso mudou de tom



MoMA exibe a inédita Guitar, obra que alterou o rumo da história da arte

Guitar, Sheet Music, Glass
Paris, autumn 1912
Papers and newsprint (Le Journal, 18 November 1912)
pasted, gouache and charcoal on paper
48 x 36.5 cm
McNay Art Museum, San Antonio, TX
Daix 513

Holland Cotter

Estamos em 1912 e Pablo Picasso está em Paris, pensando: "E agora, o que mais?" Alguns anos antes, ele havia pintado o espetacular Les Demoiselles d"Avignon. As pessoas ficaram chocadas, os amigos não sabiam o que dizer. Animado com o alvoroço, fez variações sobre o tema: pinturas de mulheres nuas em cor de madeira, o corpo fragmentado. Ele mudou a história com sua obra. Substituiu o ideal benigno do nu clássico por nova linhagem de sexualidade armada e seres perigosos.
Ao mesmo tempo tudo que era fundamental em sua arte não foi alterado. A figura humana continuou soberana, a abstração inexplorada. A pintura ainda era reflexo do mundo que conhecíamos, não uma realidade alternativa com suas leis próprias. E Picasso teve de se perguntar até onde estava disposto a ir. Muito longe, como ocorreu, e a que ponto chegou é o tema de Picasso: Guitars 1912-1914, mostra que fica no Museu de Arte Moderna de Nova York até de 6 de junho, composta de 65 objetos pequenos relacionados por temas: pinturas, desenhos, colagens e combinações, com duas esculturas famosas, uma delas exibida pela primeira vez desde que deixou o ateliê de Picasso após a sua morte.
A mostra é o registro de breve, mas intensa revolução que forjou algumas das ideias mais desafiadoras na arte moderna. Em 1912, inspirado pelo amigo Georges Braque, Picasso abandonou a pintura retratista para se concentrar em naturezas-mortas. E juntos desenvolveram o que veio a ser chamado de cubismo.
As obras mais antigas da mostra revelam que Picasso ainda está apegado à identidade de pintor. A composição feita com objetos recortados e planos superpostos Bottle, Guitar and Pipe (óleo s/ tela, 1912) tem marcas de densa colagem, com letras de um texto copiadas e coladas, e sombras entre os planos superpostos. Mas as sombras e o texto foram retocados. Logo Picasso expande seu repertório. Guitar, Sheet Music and Glass, do fim de 1912, é uma colagem feita com jornal picado, partituras e papel de parede imitando madeira. Um desenho colado é o único exercício que exigiu suas habilidades de pintor. E em uma colagem elegante, Guitar, de 1913, não há nenhuma pintura. O que existe é a realidade cubista: coisas coladas sobre outras coisas nada convencionais.
Hoje, quase um século depois, é difícil avaliar quão desestabilizador foi esse trabalho alguns na época. Mais do que simples exemplo do trabalho de menino travesso turbulento, ele foi percebido como um tapa no rosto da beleza, do idealismo e do decoro, prova de uma cultura europeia em declínio. Guitar é a peça central desta mostra. Picasso a criou em Paris em 1912. Quase do tamanho de uma guitarra normal, ela parece frágil e, claro, jamais foi tocada. E representa muitas das dúvidas estéticas que o cubismo levantou.
O que é real? E por que uma versão do real é melhor do que outra? O que é "alto" e o que é "baixo"? O que faz com que o durável tenha mais valor do que o efêmero? O que torna um objeto uma arte e uma ideia não? Exatamente porque suscita tais ideias, a guitarra de papelão, com a versão posterior dela em chapas metálicas, também exposta, foi uma das mais influentes esculturas do século 20. Picasso parece ter dado a ela grande valor. Ele a fotografou em 1912 e depois a desmontou e a embalou. Apesar das solicitações, não exibiu essa escultura durante toda sua vida. E deixou-a para o MoMA ao morrer, em 1973.
Para expô-la, o museu reuniu um conjunto excepcional de obras maravilhosas e raras, como Bar Table With Guitar (1913), colagem de papel em que os elementos reunidos estão presos inteiramente com alfinetes. E a pequena colagem Head (1913), em que ele acrescenta um olho à simples composição de um cone branco sobre uma base escura.
O cubismo, pelo menos na sua forma inicial, foi aniquilado pela 1.ª Guerra. Quando o horror terminou, ninguém queria ouvir falar de instabilidade da realidade, ou do relativismo dos valores, estética ou qualquer outra coisa. O que não significa que o cubismo morreu. Como estilo, ele floresceu, mas essa é outra história. 
TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO 

The New York Times

sábado, 19 de fevereiro de 2011

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Hino dos Comedidos Autor Lupe Cotrin - Antonio Abujamra


The Egyptian Revolution on Twitter



Equador traz pista a cientistas sobre segredo da longevidade



Pesquisa mostra que anões de uma aldeia são livres de doenças associadas à idade, como câncer e diabete

Pessoas que vivem em aldeias remotas do Equador têm uma mutação que pode jogar luz sobre a longevidade humana e as maneiras de aumentá-la. Os aldeões, geralmente com menos de 1 metro de altura, possuem uma rara condição conhecida como síndrome de Laron ou nanismo tipo Laron. E são livres de duas doenças associadas ao envelhecimento, câncer e diabete.
Um grupo de 99 aldeões com a síndrome foi estudado por 24 anos por Jaime Guevara-Aguirre, médico especializado em diabete. Ele os descobriu quando viajava a cavalo para uma aldeia montanhosa. A maioria dessas aldeias é habitada por índios, mas esses aldeões eram europeus, com sobrenomes espanhóis típicos de cristãos-novos.
À medida que Aguirre acumulava dados, notava um padrão notável: embora o câncer fosse frequente entre pessoas que não tinham a mutação de Laron, os que a tinham quase nunca contraíam a doença. E nunca desenvolviam diabete, apesar de muitos serem obesos.
Valter Longo, pesquisador do envelhecimento na Universidade do Sul da Califórnia, viu nesses pacientes uma oportunidade para explorar em pessoas as mutações genéticas que podem fazer animais de laboratório viverem mais que o normal.
Os pacientes de Laron têm uma mutação no gene que produz o receptor para o hormônio do crescimento, uma proteína na membrana de células. Sua região externa é reconhecida pelo hormônio do crescimento; a interna envia sinais pela célula quando o hormônio do crescimento aciona o receptor. A mutação dos pacientes de Laron faz com que seu receptor do hormônio do crescimento não tenha as últimas oito unidades da região exterior, por isso não alcança o hormônio do crescimento.
Em crianças normais, o hormônio do crescimento faz as células do fígado produzirem outro hormônio, o fator de crescimento semelhante à insulina, ou IGF-1, e esse hormônio faz as crianças crescerem. Se os pacientes de Laron receberem o IGF-1 antes da puberdade, eles podem crescer até uma altura bastante normal.
É aí que a fisiologia dos pacientes de Laron se associa a estudos de longevidade. O IGF-1 é parte de uma via de sinalização que existe tanto no nematódeo de laboratório como em pessoas. O gene que faz o receptor para o IGF-1 no nematódeo é chamado DAF2. E os nematódeos em que esse gene é eliminado vivem duas vezes mais que o normal. Os pacientes de Laron têm defeito equivalente.
Longo diz que ter níveis baixos de IGF-1 foi a característica decisiva para os pacientes de Laron se livrarem de doenças associadas à idade. Com Aguirre, ele expôs células humanas que cresciam numa placa de Petri ao soro de pacientes de Laron. As células foram então danificadas com um químico que rompe seu DNA. O soro de Laron protegeu as células contra danos genéticos e instigou as células danificadas a se autodestruírem. Os dois efeitos foram revertidos quando pequenas quantidades de IGF-1 foram adicionadas ao soro. 
no THE NEW YORK TIMES
TRADUÇÃO DE CELSO M. PACIORNIK 


Charlie Chaplin - The Immigrant



Charlie Chaplin - The Immigrant Part 1/2





Charlie Chaplin - The Immigrant Part 2/2

sábado, 12 de fevereiro de 2011

O fim de uma piada de três décadas




ISSANDR EL AMRANI


O que ocorreria se você passasse 30 anos fazendo piadas a respeito do mesmo homem? E se, na última década, tivesse zombado da sua morte iminente - mas ele continuou vivo, fazendo com que todas as histórias sobre sua imortalidade pareçam, de uma maneira incômoda, próximas da verdade?
Os egípcios, conhecidos pelo seu subversivo humor político, vivenciaram até ontem este cenário: Hosni Mubarak, seu presidente octogenário, às vésperas de entrar na sua quarta década de governo, agarrando-se ao poder e à vida com uma enorme força de vontade. Os piadistas egípcios, que de início caricaturavam seu líder nada carismático como um matuto ganancioso, passaram os últimos anos nervosamente fazendo piadas sobre sua insistência tenaz em permanecer no trono. E justamente agora, quando o humor começava a parecer um pouco obsoleto, veio a renúncia do ditador.
Um amigo meu adorava contar esta piada: "Qual é o dia perfeito para Mubarak? Aquele em que nada acontece". O agora ex-presidente egípcio preferia o status quo e não apreciava mudanças, mas a sua fantasia com o Dia da Marmota afetava enormemente os egípcios. Mubarak sobreviveu a tentativas de assassinato e a uma cirurgia complicada. Depois de passar a maior parte de 2010 convalescendo, todo mundo no Cairo -de motoristas de táxi a políticos e espiões estrangeiros - estava convencido de que ele morreria em questão de semanas. Mas ele se recuperou, aparentemente pensando em concorrer a um sexto mandato em setembro. Os prolíficos piadistas, com sua longa tradição de satirizar os poderosos, poderiam ficar sem material.
Fazer piada de autoridades tirânicas é uma parte essencial da vida egípcia desde a época dos faraós. Um comentário datado de 4.600 anos registrado em papiro gracejava que a única maneira de convencer o rei a pescar era colocar garotas nuas nas redes de pesca. Sob o império romano, os advogados egípcios foram proibidos de exercer a profissão por causa do hábito que tinham de fazer piadas, o que para os austeros romanos corroía a seriedade própria dos tribunais. Até Ibn Khaldun, o grande filósofo árabe do século 14, de Túnis, observou que os egípcios eram um povo extraordinariamente irreverente e hilário. O ator egípcio Kamal al-Shinnawi, também um mestre do sarcasmo, disse certa vez que "a piada é a arma devastadora que os egípcios sempre usaram contra invasores e ocupantes. Foi a corajosa guerrilha que penetrou nos palácios dos dirigentes e nos bastiões dos tiranos, interrompendo o seu descanso e deixando-os em pânico".
Existe muito material sobre os últimos 50 anos no Egito, marcado que foi por uma sucessão de líderes militares com pouco respeito pela democracia ou pelos direitos humanos. Embora até esta semana os egípcios estivessem virtualmente impotentes para mudar seus governantes, eles sempre tiveram uma ampla liberdade para ridicularizá-los com pilhérias, ao contrário da Síria, onde uma piada pode levá-lo à prisão. Nos povoados e cidades muito densos, onde a socialização é mais intensa, as piadas funcionam como uma maneira quase universal de "quebrar o gelo", ou dar início a uma conversa, e os temas básicos, que transcendem os governantes, as ideologias, as barreiras de classe, quase sempre são os mesmos: nossos líderes são idiotas, nosso país, uma confusão, mas pelo menos conseguimos fazer piadas juntos.
Os que governaram o Egito antes de Mubarak, o nacionalista Gamal Abdel Nasser e o prêmio Nobel da Paz Anwar Sadat, eram personagens exuberantes, e as piadas contadas sobre eles refletiam sua personalidade fora do comum. O paranoico Nasser teria mobilizado sua polícia secreta para recolher as piadas sobre ele e seu governo autoritário, da mesma maneira que a KGB monitorava nervosamente as legendárias anekdoty feitas na mesa da cozinha sobre o governo gerontocrático, para compreender realmente o que sucedia nos derradeiros dias da União Soviética. Sadat, apesar de conhecido no Ocidente pela paz firmada com o vizinho Israel, foi alvo de inúmeras piadas envolvendo seu governo corrupto e sua atraente esposa, Jehan.
Após o assassinato de Sadat, Mubarak assumiu o poder e foi recebido com alívio e ceticismo - alívio, pois parecia ter pulso mais firme do que o seu antecessor, que se tornou esquizofrênico um ano antes da sua morte, e ceticismo porque Mubarak não tinha absolutamente nada que se assemelhasse ao governo carismático que Sadat e Nasser encarnaram. Mubarak também era, pelo menos no começo, um piadista. Não muito tempo depois de assumir o poder, ele mesmo gracejou que jamais esperara ser nomeado vice-presidente. "Quando fui chamado por Sadat", disse ele a um entrevistador, "achei que seria nomeado chefe da EgiptAir".
Por décadas Mubarak foi ridicularizado, chamado de "La Vache qui Rit" (A vaca que ri) - numa referência ao queijo francês que apareceu no Egito nos anos 70, com a abertura do mercado - por causa das suas raízes rurais e seu estilo bonachão. A imagem que persistia nas piadas a seu respeito na época era a de um arquétipo egípcio, o camponês bufão e ganancioso.
Uma piada que me lembro bem dos anos 80 satirizava a decisão de Mubarak de não nomear um vice-presidente depois de assumir a presidência. "Quando Nasser tornou-se presidente, ele queria um vice mais estúpido do que ele para não ter um concorrente, então escolheu Sadat. Quando Sadat tornou-se presidente, escolheu Mubarak pela mesma razão. Mas Mubarak não tem um vice porque não existe no Egito ninguém mais estúpido do que ele."
As piadas ficaram mais acerbas nos anos 90, à medida que Mubarak consolidou seu poder e começou a vencer eleições com mais de 90% dos votos, expurgando seus rivais no Exército. Uma história sempre relatada é a de que ele enviou seus assessores políticos para Washington para ajudarem na campanha de reeleição de Bill Clinton, em 1996, pois o presidente dos Estados Unidos admirava a popularidade do egípcio. Ao chegarem os resultados, Mubarak é que teria sido eleito o presidente dos EUA.
Mas as piadas sobre o presidente egípcio na verdade viraram uma mania no inicio de 2000, quando ele completou 70 anos e começou uma vigília nacional. Uma delas, por exemplo, fala de Mubarak no seu leito de morte, lamentando para o seu assessor: "O que o povo egípcio fará sem mim?" Procurando confortá-lo, o assessor, respondeu: "Senhor presidente, não se preocupe com os egípcios. É um povo forte que conseguirá sobreviver mesmo comendo pedra!". Mubarak faz uma pausa, reflete sobre isso e depois diz ao assessor que era preciso dar ao seu filho Alaa o monopólio do comércio de pedras.
Numa outra cena, Azrael, o arcanjo da morte, chega ao presidente egípcio e diz que ele precisa se despedir do seu povo. E ele indaga: "Por que, aonde estão indo?". Azrael tornou-se uma figura comum nas piadas, e a mais famosa delas faz alusão à reviravolta brutal do governo Mubarak nos anos 90. Deus convoca Azrael e lhe diz: "É hora de buscar Hosni Mubarak"."O senhor tem certeza?", pergunta Azrael, timidamente.
Deus insiste: "Sim, chegou a hora dele; vá e traga-me a sua alma".
Azrael desce para a Terra e dirige-se ao palácio presidencial. Chegando lá, tenta entrar, mas é capturado pela Segurança do Estado. É jogado numa cela, espancado e torturado. Depois de alguns meses, é libertado.
De volta ao céu, Deus, ao vê-lo todo machucado e arrebentado, pergunta: "O que aconteceu?"
"A Segurança de Estado de Mubarak me espancou e me torturou", Azrael responde. "E agora me mandaram de volta." Deus fica pálido e, com uma voz apavorada, pergunta: "Você não disse que fui eu que o mandei, não é?"
Não é somente Deus que tem pavor de Mubarak - mas também o demônio. Outras anedotas falam de Mubarak deixando o diabo em estado de choque com suas ideias para martirizar o povo egípcio, ou morrendo e tendo sua entrada recusada tanto no céu como no inferno, porque é considerado uma pessoa abominável por Deus e pelo Satanás.
A internet abriu novas janelas para o humor. Comentários sarcásticos que costumavam circular online nas mensagens de texto agora são transmitidas pelo Twitter, enquanto no Facebook foram criadas identidades falsas e páginas satíricas sobre políticos conhecidos do país.
Mas hoje a maior parte dessas sátiras é sobre a tenacidade com que Mubarak se agarra à vida e ao poder. Hishan Kassem, conhecido editor e uma figura da oposição liberal, contou-me esta :
Hosni Mubarak, Barack Obama e Vladimir Putin estão reunidos quando de repente Deus aparece para eles: "Vim aqui para lhes dizer que o fim do mundo será daqui a dois dias. Avisem o seu povo".
Assim, cada um dos líderes volta para sua capital e prepara um discurso pela TV para fazer o comunicado.
Em Washington, Obama diz: "Meus caros americanos. Tenho uma boa e uma má notícia. A boa é que posso confirmar que Deus existe. A má notícia é que ele me disse que o mundo vai acabar em dois dias".
Em Moscou, Putin declara: "Povo da Rússia, lamento lhes dar duas más notícias. A primeira é que Deus existe, o que significa que tudo aquilo em que nosso país acreditou durante todo o último século era falso. Em segundo lugar, o mundo estará acabando dentro de dois dias".
No Cairo, Mubarak diz: "Egípcios, venho lhes dar duas excelentes notícias! Primeira, Deus e eu tivemos uma importante reunião. A segunda é que ele me disse que serei o seu presidente até o fim dos tempos".
Para Hishan Kassem, o principal legado do governo Mubarak talvez seja a abundância de chacotas sobre seu líder. "No governo de Nasser, era a elite, cuja propriedade ele nacionalizou, que fazia piadas sobre o presidente". E, no governo de Sadat, "foram os pobres que ficaram abandonados pela liberalização econômica que faziam piadas. Mas no caso de Mubarak, são todos que o satirizam".
Mas um grande número de egípcios não achava mais que a situação do seu país era assim tão divertida e estava transformando o talento nacional para a sátira numa arma agressiva de dissidência política. O movimento Kifaya, contra Mubarak, usou o humor mais pungente para manifestar a indignação de uma nação inteira que se tornou um país de segunda mão para a família do presidente, com os planos de Mubarak para indicar seu filho Gamal como seu herdeiro. Outros manifestantes, queixando-se do alto custo de vida e dos salários estagnados, usaram caricaturas para representar políticos e magnatas roubando o país. E desde o início de 2010, o laureado com o prêmio Nobel Mohamed ElBaradei, ex-diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e um candidato potencial à presidência, tornou-se o símbolo de uma liderança digna que a oposição egípcia busca há décadas. O interessante é que, recentemente, Baradei censurou Mubarak por um comentário engraçado sobre um acidente com uma balsa que provocou a morte de mais de mil egípcios em 2006.
Mas mesmo que os democratas do Egito tenham conseguido impedir que o herdeiro de Mubarak o suceda no cargo, com certeza continuarão fazendo piadas sobre Gamal, filho do agora ex-presidente. Uma sátira épica foi criada na forma de um blog popular chamado Ezba Abu Gamal (O vilarejo do pai de Gamal). O blog é uma coleção de comentários, normalmente da perspectiva de Abu Gamal, prefeito de um vilarejo. A esposa está sempre insistindo para o filho ser promovido, mas Gamal tem muitas dúvidas a respeito: o rapaz não entende nada de reformas, laptops e assim por diante. É uma descrição mordaz para os iniciados na política egípcia. A persona de "camponês astuto" de Mubarak ressurge no seu filho e Gamal é descrito como um indivíduo inexperiente e incompetente, manipulado pelos amigos.  
TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
É ESCRITOR EGÍPCIO. FOI ANALISTA PARA O NORTE DA ÁFRICA DO INTERNATIONAL CRISIS GROUP 
fonte: O Estado de S.Paulo

Ponham os olhos na Aljazeera e tirem os olhos da Aljazeera!





*João Moreira de Sá



Cada vez estou mais convencido de que há dois portugais. Ou três. O real, o imaginado e o desejado. Aparentemente nenhum deles é grande coisa mas tem o inconveniente de pôr as pessoas a viverem realidades diferentes e, pior, a ver as coisas de forma diferente. Ou pior, a não ver.
Quando no meu portugal vejo aparecer uma música de que as pessoas se apropriam, pelo tanto que se revêm nas palavras, logo vem o outro Portugal, o que não, que música de intervenção é Zeca Afonso, aparentemente começou e acabou com ele, privilégio eternamente reservado, assim à democrata. Piora se um qualquer Louçã se atreve a uma referência à dita canção, porque aos 'zecas' junta-se mais um portugal, o do preconceito, o da ideia feita, onde qualquer verdade, se dita na voz de Francisco Louçã ou de Paulo Portas passa de imediato a tenebrosa demagogia, a palavra mágica dos tempos correntes para ignorar verdades.
No meu portugal há um Estado absolutista que me impõe regras que nem deviam ser legais. Que me obriga a passar recibos verdes online,. Que me obriga e entregar o IRS online. Mas que depois não é capaz de me deixar votar online, pois se nem ainda chegou à fase de conseguir condições técnicas de eu conseguir saber o meu novo número de eleitor online para poder votar! (porque no meu portugal eu sou obrigado a pagar um cartão de cidadão - a cidadania paga-se - e um novo número de eleitor mas o meu portugal não tem quaisquer obrigações para comigo, nem de me informar em devido tempo que novo número de eleitor Comprei).
No meu portugal o serviço de internet não é gratuito e o Estado obriga-me a pagar por um. No meu portugal ter conta num banco custa dinheiro e o Estado obriga-me a ter uma (obriga, sim, porque o cheque do "reembolso" do IRS, o dinheiro que durante o ano fui emprestando ao estado e que este me faz o favor de devolver mas sem juros, o que não vale no sentido inverso, não pode ser levantado, tem que ser depositado).
No meu portugal eu desconto todos os meses para a segurança social, mesmo que esteja há 4 meses sem ganhar 1€ que seja. Porque eu não desconto só sobre o que ganho ou quando ganho (sim, recibos verdes, claro), há outros portugueses deste portugal que o fazem, mas também não é muito melhor, descontam sobre o pouco que ganham quando têm emprego regular e deixam de descontar quando estão desempregados. Não é grande vantagem.
O portugal imaginado chama a isto progresso, Choque Tecnológico, vamos ser o primeiro e-País. Sendo assim tem lógica que sejamos nós a primeira aplicação ai-Povo. O Portugal desejado neste momento não se sabe muito bem onde anda, parece que se tem que perguntar a uma senhora alemã.
Ah! mas eu também estou a falar mal do governo... Quem disse? Eu nem falei em governo! Você é que pensou nisso, eu só falei em Estado. O Estado livre este em que vivo desde os 6 anos. Teve muitos governos, já. Todos juntos pouco mais conseguiram que fazer o melhor que puderam e souberam para não estragar muito. Não, eu estou a falar de como é duro viver num país absurdo, só isso, nem estou a falar de política, estou a falar da vida real, do dia-a-dia. Os políticos, esses não vivem no portugal dos recibos verdes, dos descontos para a reforma que não vai haver.
O meu portugal revolta. Parece que revolta a todos mas de formas diferentes. A uns causa revolta a classe política, assim, por inteiro; a outros causa revolta viver num país em "que para ser escravo é preciso estudar"; ainda a outros causa maior revolta que uma música possa estar a espelhar essa revolta (ainda se fosse do Zeca...). Mas como é que se revolta uma "geração sem remuneração"? "Vão sem mim que eu vou lá ter" que agora estou aqui no conforto do sofá a ver a revolução no Egito na Aljazeera porque hoje somos todos egípcios!
Somos todos egípcios o CARA...ças! Eu não sou! Não sou porque me recuso a, com a minha passividade, insultar um povo que agiu, em vez de calar em angustia a revolta; agiu, quando percebeu que não se chega a lado nenhum com cantigas, nem com palavras; agiu, quando em vez de escrever desabafos estéreis (assim como este), levantou o AlCú do al-sofah e decidiu fazer alguma coisa: pedir um Egito para eles.
Nós temos lá tempo e paciência de exigir um Portugal com P maiúsculo (ou mesmo um Egipto com Pê) para nós! isso envolve manifs e assim. E nas manifs há muita gente. E depois não há lugar para estacionar o carro.
João Moreira de Sá no twitter @arcebispo 

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Gen X, Y ou Z? Qual é a sua?





Classificar as pessoas em gerações sempre causa controvérsias; além disso, depois do Z, o que vem? 


MÁRION STRECKER


AO ESCREVER sobre a Gen Z, no mês passado, fui questionada sobre a razão desse nome. Geração Z de zapear, pregaram alguns. Geração Z porque Z vem depois de Y, disseram outros. 
Cem anos atrás, as gerações eram descritas apenas por nomes, não por letras. Como está narrado no livro "Paris É Uma Festa", de Ernest Hemingway (1899-1961), o termo Geração Perdida foi tomado por Gertrude Stein (1874-1946) de um mecânico que ralhava com um funcionário e usado em seguida para caracterizar seu círculo de amigos mais novos, em particular escritores e artistas que viviam na Europa depois de servir na Primeira Guerra. 
Era o caso de Hemingway, que achou no final que "todas as gerações eram perdidas, por alguma razão". Depois da Geração Perdida, vimos surgir o termo Greatest Generation, cunhado pelo jornalista Tom Brokaw para se referir às pessoas que nasceram sob as privações da Grande Depressão e contribuíram materialmente ou lutando na Segunda Guerra. Virou livro. 
E depois veio a Geração Silenciosa, jovem demais para ter lutado na Segunda Guerra, mas que também viveu seu impacto profundamente. 
Acho que minha mãe é dessa geração. Com o fim da Segunda Guerra veio a Geração Baby Boom, assim batizada devido ao crescimento das taxas de natalidade. E depois dos "boomers" veio a Geração X. 
O termo Geração X foi cunhado pelo fotógrafo Robert Capa no começo dos anos 50 e depois serviu como título de um ensaio fotográfico seu com jovens. Disseram que se referia aos jovens ainda sem identidade, talvez sem futuro, ou com um futuro incerto, por isso o X. Geração X também se tornou o nome de um livro de sociologia, de Jane Deverson e Charles Hamblett, publicado em 1965. Falava dos jovens que dormiam juntos antes de casar, que não aprenderam muito bem quem era Deus e/ou que não obedeciam mais a seus pais. 
Consta que um exemplar do livro foi parar na casa da mãe do músico inglês Billy Idol, que batizou sua banda punk de Geração X, de 1976 a 1981. Digamos que a Geração X nasceu entre 1950 e 1970 e viveu o surgimento do computador pessoal, da TV a cabo, do videogame e da web. 
Depois da X, claro, tinha de vir a Geração Y, nascida a partir de 1980 (os anos são sempre definidos arbitrariamente). Muito mais familiarizadas com a comunicação, as mídias e as tecnologias digitais, as crianças da Gen Y ensinaram seus pais a usar os controles remotos enormes ou a gravar filmes da TV. 
A Gen Y adotou e-mail, mensagem de texto via celular e MSN como formas de comunicação, enquanto lia "O Senhor dos Anéis", crescia com Harry Potter ou via a trilogia de "Star Wars" em tela gigante. Música digital, iPod e download grátis se tornaram triviais. Acho que é bem a geração do meu filho, de 20 anos. 
Mas o tempo não para, assim como a fabricação de rótulos, e chegou a Gen Z, dos chamados nativos digitais. Esses não só demonstram uma incrível facilidade de lidar com qualquer tipo de equipamento novo como gostam de consumir "tudo ao mesmo tempo agora". 
Usam instintivamente todos os recursos das redes sociais, como Facebook ou Twitter, e, se tiverem dinheiro, serão viciados também em smartphones (como o iPhone) e tablets (como o iPad). 
Dizem que a Gen Z é mais consumista que a Gen Y, além de ser mais conectada. Parece o caso da minha filha de 12 anos, que adora passar a tarde no shopping do bairro com as amigas e os amigos. Sua turma fala no Skype e troca SMS ao fazer a lição de casa com a TV ligada. 
É claro que classificar as pessoas em gerações sempre causa controvérsias. Até porque a data de nascimento de alguém não precisa corresponder à mentalidade, aos valores, ao comportamento, à maneira de ser ou mesmo à aparência. 
Tenho idade para ser da Geração X, mas meu marido insiste que sou da Geração Z. Acho que ele tem ciúme da minha família Apple (Macbook, iPad e iPhone), que carrego para cima e para baixo, inclusive nas férias. Mas há um problema maior. Depois do Z, o que vem? 



MÁRION STRECKER, jornalista, é diretora de conteúdo do UOL.
fonte:Folha de São Paulo 

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Pela volta do carnaval a fevereiro




Tutty Vasques


O problema do carnaval em março é a vizinhança com o Dia Internacional da Mulher numa época em que a emancipação feminina valoriza mais os seios de silicone do que os sutiãs queimados em praça pública no decorrer das lutas pela igualdade de gêneros. Cá pra nós, fica muito difícil exaltar o papel da mulher no avanço da humanidade com elas peladas, rebolando daquele jeito na TV.
Terça-feira gorda no Brasil, convenhamos, não é ocasião apropriada para celebrar uma data originada em manifestações de operárias russas por "Pão e Paz" às vésperas de 1917. No Ocidente, o 8 de março homenageia 130 tecelãs trancadas e carbonizadas dentro de uma fábrica de tecidos na Nova York do final do século 19, durante repressão a movimento grevista por melhores condições de trabalho. Por mais que, no Rio, os desfiles das escolas de samba em 2011 estejam irremediavelmente marcados por outro incêndio, brincadeira com fogo tem hora.
Imagina o constrangimento de Dilma Rousseff, logo no seu primeiro pronunciamento à Nação como presidente no Dia Internacional da Mulher, dividindo a atenção dos queridos brasileiros e brasileiras com a passagem do bloco Calma, Calma, Sua Piranha. Isso tem de mudar!
fonte:O Estado de São Paulo

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

"Tá faltando ele"



Para o meu Pai



Quando
Álvaro de Campos
Quando olho para mim não me percebo. 
    Tenho tanto a mania de sentir
    Que me extravio às vezes ao sair
    Das próprias sensações que eu recebo.

    O ar que respiro, este licor que bebo,
    Pertencem ao meu modo de existir,
    E eu nunca sei como hei de concluir
    As sensações que a meu pesar concebo.

    Nem nunca, propriamente reparei,
    Se na verdade sinto o que sinto.  Eu
    Serei tal qual pareço em mim?  Serei

    Tal qual me julgo verdadeiramente?
    Mesmo ante as sensações sou um pouco ateu, 
    Nem sei bem se sou eu quem em mim sente.